Vocês já tiveram de fazer uma prova, doentes? Sabem, quando estão passando mal, com tontura e ponto de botar seu café da manhã pra fora? É assim que me sinto toda vez que tenho de fazer um teste.
Desde que entrei na escola, sempre fui tachada de burra e as coisas só pioraram quando Dimi entrou. Não que eu tenha raiva dele por ter os mesmos “problemas” que eu e ainda tirar notas altas, afinal ele é meu melhor e único amigo, mas, às vezes, cansa ver ele se dar tão bem e eu tão... Mal.
- Acabou o tempo, senhorita Agnes – disse o professor Bundão. Ta, seu nome não é Bundão, se fosse, ninguém iria levá-lo a sério.
- Por favor, Senhor Turner, me de mais uns minutinhos – falei fazendo uma carinha de cachorro que caiu da mudança.
- Não Agnes! Alguns “minutinhos” a mais não vão te tornar menos burra – toda a classe começou a rir. Encolhi-me em minha carteira, vestindo o capuz de meu casaco. Bundão, vamos chamá-lo assim a partir de agora, aproveitou-se desse momento pegar a prova de minha mesa.
- Sabe Agnes – disse ele se virando para olhar diretamente em mim – essa coisa de dislexia, TDA... Eu não acredito que elas existam. São só desculpas para amenizar a burrice e ignorância de pessoas como você. Um bom exemplo é o senhor Lucas. Olhem, falaram que tinha toda essa baboseira e ainda sim, ele tira notas excelentes – fez uma pausa meio dramática – Porque, Agnes, você não pode parar de derreter sua mente com essa tinta barata que você põem no cabelo e deixar seu cérebro trabalhar um pouco, só para não envergonhar mais seu pai?
As risadas explodiram pela sala. Todos apontavam para mim falando coisas más, e eu, em uma tentativa inútil, tentava não prestar atenção. Sempre foi assim, todos rindo, fazendo brincadeiras, e principalmente jogando meus defeitos bem na minha cara.
- Pelo mesmo motivo que o senhor usa essa peruca. Para esconder uma coisa pelo qual você tem vergonha! – falei num súbito momento de coragem. Todos pararam de rir surpresos. Não sou assim tão... Petulante. Fico na minha, agüentando o sofrimento em silêncio, mas tem vezes que me descontrolo e muito. São nessas vezes que eu acabo sendo suspensa ou até mesmo expulsa – Posso até ser burra, mas burrice é curável. Feiúra e calvície não são!
- Selini Agnes – disse ele calmamente – Vá. Para. A. Diretoria. Agora.
- Claro Bundão – peguei minha mochila, já saindo da classe antes que o idiota do Turner me xingasse mais ainda.
Andei calmamente pelo colégio, sem nenhuma pressa de chegar à diretoria. Nunca entendi muito bem o problema que as pessoas têm com o meu cabelo. Tudo bem, eu sempre o pintei de vermelho por causa de sua cor natural meio estranha e ok, eu também uso lentes de contatos coloridas para esconder a cor prata estranha que são meus olhos, mas... O que meu cabelo tem de tão errado?
- Eles são muito vermelhos – disse alguém atrás de mim. Nem precisei me virar para ver quem era.
- Está violando o código de honra Lucas – falei virando-me – esqueceu que não podemos nos ver na escola?
- Que é isso Seli – lancei-lhe um olhar do tipo: “Vai contrariar?” – Tudo bem, você venceu. Mas não tem ninguém nos vendo aqui.
Voltei a andar, não fazendo nenhum comentário sobre o que ele havia dito. Eu e Dimitri tínhamos um contrato não-verbal a ser seguido. Na escola, nós não nos falaríamos a não ser que fosse extremamente necessário ou quando não tivesse ninguém por perto. Nenhum de nós dois queria que toda a Hill’s High School nos visse andando juntos.
Pode parecer meio fútil, idiota, ou seja, lá o que vocês estejam pensando, mas é melhor assim. E apesar de tudo, mesmo com esse acordo, nós sabemos que nossa amizade é verdadeira.
Quem me dera se pudéssemos passar disso.
- Me desculpe – disse ele de repente.
- Você sabe que não é sua culpa se minha dislexia é pior que a sua – falei olhando para o chão – ou que eu sou mais burra.
- É nisso você tem razão – disse ele rindo. Fingi um sorriso para ele não ver que eu estava meio aborrecida.
Drew olha pra mim
Eu finjo um sorriso então ele não vai ver
Que eu quero e estou precisando
Tudo o que deve ser
- Tenho que ir – falei assim que chegamos na porta da sala da diretora.
- Eu queria poder te esperar, mas prometi que iria me encontrar com a Carly – disse ele passando a mãe pelos cabelos loiros – a gente se vê mais tarde?
Assenti.
- Boa sorte.
- Não preciso de sorte, Dimitri. Preciso de uma vida nova – falei entrando na sala. Ele não poderia ver as lágrimas que começavam a se formar em meus olhos.
Ele é a razão das lágrimas no meu violão
A única coisa que me deixa desejando em uma estrela cadente
Ele é a canção dentro do carro que eu continuo cantando
Não sei por que eu faço
- Como assim você foi suspensa? – perguntou Valerie quando cheguei em casa. Valerie é irmã mais nova do meu pai. Desde que eu cheguei aqui em casa, ela mora conosco, foi como uma segunda mãe para mim, apesar de ter somente 30 anos de idade. Val é a pessoa mais linda e ao mesmo tempo estranha que alguém poderia conhecer. Tem cabelos pretos como os de papai, mas olhos tão azuis que chegam a ser meio roxos. Toda semana, ela faz mechas de uma cor diferente no cabelo. Hoje, seus cabelos estavam com mechas em um tom de branco. Me lembrou muito a Vampira do X-Man.
- Não tenho culpa se o professor fica me ofendendo na frente de toda a sala. Você queria que eu fizesse o que? – bufei irritada. Aquele Bundão me dá problemas até em casa.
- Sei lá, calasse a boca por cinco minutos? – sentei-me no sofá, jogando minha mochila em um canto qualquer. Val se sentou ao meu lado, colocando uma das mechas brancas atrás da orelha.
- Eu cansei Val. Cansei de ir à escola. Por que não posso voltar a viajar com o papai? Eu poderia estudar com ele e fazer as provas por correspondência.
- Você sabe que a coisas não são assim, Seli – disse passando o braço pelos meus ombros – Olha, só faltam mais um mês até as aulas acabarem. Agüente esses trinta dias e aí nós vemos o que vamos fazer ok?
- Se você diz – fui para meu quarto, fechando a porta com um estrondo. Mau eu sabia que esse acordo nunca iria se realizar.
Esforçando-se para chegar
Mas quando eu tentei falar para fora
Senti como se ninguém pudesse me ouvir
Queria continuar aqui
Mas algo parecia tão errado aqui
Então eu rezo
Eu poderia me libertar
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